De todo modo, não se pode descartar uma união agradável e rica por acreditar que não envolve amor suficiente. A vida a dois requer respeito, parceria, projetos em comum. Se existe amor, melhor ainda.
Culturalmente, as pessoas estão acostumadas a acreditar que o amor é tudo em uma relação. A família ensina assim e a sociedade, de uma forma ou de outra, colabora com a crença. Mas pensar dessa forma nem sempre é saudável para quem vive um relacionamento. Amor é bom, mas só ele não basta. Acreditar nisso impede que os parceiros avaliem o compromisso conjugal com clareza, que enxerguem o que está acontecendo naquele determinado momento da relação, e dificulta as aprendizagens, as mudanças.
Quando essa definição cultural se soma a dificuldades pessoais, a união vai se cristalizando e perdendo a possibilidade de ser reavaliado. Por carência, ilusão ou medos, muitas pessoas ficam em relacionamentos ruins com a desculpa de que os envolvidos “se amam”. O fato de considerarem isso o mais importante faz com que não avaliem outros aspectos, muito importantes, que fazem parte de uma relação de casal. Em nome do amor, suportam ser maltratadas, rejeitadas, desqualificadas. Convivem com a solidão a dois, com a falta de parceria (no uso do dinheiro, nos projetos, na divisão de tarefas). Ou toleram diferenças profundas de valores, de ética, de moral. O fato de haver amor acaba se tornando uma desculpa para não tomar decisões, fazer escolhas ou responsabilizar-se.
Por mais importante que seja o amor é apenas um dos elementos que justificam uma relação. E não estou falando em paixão – aquele entusiasmo desorganizador, avassalador, que faz com que a pessoa só enxergue no outro o que lhe agrada e só mostre para o outro o que o manterá interessado. Estou falando de amor verdadeiro, forte e profundo. Aquele sentimento de pertencimento, de carinho e compaixão, de satisfação de estar junto, de compreensão e respeito pelas dificuldades do outro. Mesmo esse encantamento maduro não é suficiente para manter um relacionamento saudável. Além dele – e, em alguns casos, mais do que ele –, precisa haver respeito, qualificação, parceria, projetos e objetivos comuns (o que inclui a aquisição de bens, a decisão de ter filhos ou não e outras coisas que envolvem os dois).
Os casais que têm essa soma de elementos e também há amor são privilegiados. E sabem que vale a pena dedicar-se, esforçar-se, alimentar o amor e as outras características da relação para manter a parceria. Para outros, o amor nem é o principal. A vida em comum, rica e agradável, basta. O sentimento amoroso acaba por ser alimentado por todos os outros elementos. Nesses casos, quem enxerga a complexidade da situação pode, com maturidade e perseverança, cuidar da relação e torná-la cada dia mais plena e realizadora. Agora, se um ou outro cai na armadilha de achar que o que tem é pouco, porque acredita naquela verdade preestabelecida de que o amor é tudo, correrá o risco de se entregar aos melindres da carência e da fantasia, pondo a relação em risco.
Por isso é que se faz necessário acabar com o mito que estamos acostumados a ver em filmes e novelas: mais importante do que o casal se amar é ele viver bem e feliz, num relacionamento que traz aprendizagens e crescimento. Isso é uma relação plena.
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