A
profissão tem pouco ou quase nada do “glamour” que a ela se atribui. A pessoa,
então, ao decidir abraçar esta atividade deve estar atento, desde sempre, que a
solenidade de antigamente hoje corresponde a uma atuação silenciosa e quase
operária, visando à diminuição da quantidade de processos e à busca pela
realização dos atos processuais da forma mais rápida possível, a despeito de
inúmeras dificuldades estruturais. E tudo com uma forte cobrança social e
também interna…
Para quem
pensa que o trabalho do Juiz é feito por seus assessores, saibam que ser Juiz é
estar abarrotado de processos quando o assessor invade sua sala com outras duas
urgências. Você mantém o raciocínio para concluir a decisão que estava
preparando quando é novamente interrompido porque existem advogados aguardando
para falar com você. Após atender os advogados, você tenta retomar o raciocínio
e aparece outra urgência. Neste momento, você é informado que todas as partes
já chegaram e que as 05 (cinco) audiências marcadas para a tarde já podem
começar. Além disso, existem mais de 10 (dez) minutas de sentenças na sua mesa
para serem conferidas e uma centena de despachos. A atenção para cada
sentença/decisão/despacho é que vai determinar o correto funcionamento da sua
Vara e a manutenção da coerência dos seus posicionamentos. Nada deve passar
despercebido. O erro não será perdoado!
Como já
expôs Carnelutti, “nenhum homem, se pensasse no que ocorre para julgar um outro
homem, aceitaria ser Juiz”.
A pessoa
que pretende abraçar a magistratura pensando na remuneração logo quebrará a
cara! Não vale à pena do ponto de vista financeiro, em virtude do tanto de
dedicação que a atividade lhe vai exigir. Assim, a pessoa que pretende abraçar
a magistratura pensando em não trabalhar também deve buscar outra atividade.
Quem
pretender ser Juiz deve, primeiro, ter um processo pessoal na Justiça. Este é o
primeiro passo! Deve sentir na própria pele o que é ser parte; o que é suportar
os efeitos da demora de uma decisão; o que é receber uma sentença e demorar
anos para executá-la; o que é ter seu direito negado através de uma sentença ou
decisão padrão que não analisou corretamente o caso; o que é embargar desta
decisão/sentença e receber, como resposta, que a pretensão é de mera
rediscussão do julgamento; etc.
Só assim
esta pessoa ingressará nos quadros na magistratura enxergando que: há pessoas
atrás dos processos; que ela assumiu, antes de tudo, um compromisso de
celeridade e respeito com o jurisdicionado; que ela irá trabalhar sem buscar o
reconhecimento do Tribunal a que está submetido ou de quem quer que seja,
porque o trabalho é voltado para alcançar a finalidade diuturna e simples de
entregar a cada um o que é seu; que irá trabalhar dias e noites a fio para
cumprir da melhor forma a sua profissão; que não sossegará enquanto tiver
processos na estante, que representam pessoas aguardando uma resposta; que a
resposta, ainda que negativa, deve ser rápida, para propiciar à parte a
possibilidade de recorrer; que cada pedido de habilitação representa uma pessoa
que morreu aguardando uma resposta do Judiciário; etc. etc. etc.
Aí eu
pergunto: você está pronto para este compromisso?
Assumir a
magistratura com qualquer outra finalidade, sobretudo com a finalidade nefasta
de não trabalhar ou de fazer o mínimo, chega a ser criminoso. O Juiz relapso,
acomodado, preguiçoso não sabe o mal que ele faz a todo jurisdicionado que tem
a infelicidade de ter um processo em suas mãos. É este o Juiz que você pretende
ser? É para isso que você pretende abraçar a magistratura? São questões que
merecem profunda reflexão!
Por outro
lado, todo o conhecimento cobrado no concurso é o que dará ao futuro Juiz
ferramenta para trabalhar. Ninguém se aventura a proferir sentenças e conduzir
audiências sem a preparação adequada. Logo ao entrar na audiência o Juiz poderá
estar diante de um representante do Ministério Público e de um advogado
devidamente preparados que lhe farão questionamentos para os quais você deve
ter pronta resposta. É a preparação para o concurso que lhe dará as respostas.
Então,
não desrespeite o processo de aprendizado inerente ao concurso, que será
fundamental para a sua atuação profissional. Seja objetivo em sua preparação e
otimize o seu estudo, mas não busque atalhos ou “bizus” que proponham a
desnecessidade do estudo ou pouco empenho na interpretação das matérias, das
leis, da jurisprudência…
O Juiz
não deve ser um reprodutor de julgamentos proferidos anteriormente. É preciso
que ele tenha conhecimento suficiente para criticar a interpretação dada
anteriormente e avaliar se aquela é a melhor interpretação a ser conferida ao
caso concreto. Apenas após este filtro interno é que o precedente pode ser
aplicado ao caso e, posteriormente, já sem tanto esforço, aos casos idênticos,
sem prejuízo das constantes reavaliações.
Por isso,
não despreze a necessidade de “preparar-se” para assumir uma profissão como
esta. Assuma, de logo, o compromisso de que, uma vez aprovado, será o melhor
Juiz que puder, o mais rápido, o mais trabalhador, o mais comprometido com a
seriedade da profissão.
Cabe
lembrar a lição de Calamandrei: “O juiz é o direito feito homem. Só desse homem
posso esperar, na vida prática, a tutela que em abstrato a lei me promete. Só
se esse homem for capaz de pronunciar a meu favor a palavra da justiça, poderei
perceber que o direito não é uma sombra vã”.
Fonte:
http://rehabjuridico.blogspot.com.br/2012/06/quer-ser-juiz-quer-mesmo.html
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